Quanto mais eu ouço as músicas de hoje em dia, mais eu valorizo o silêncio. E nem estou me referindo às letras, abomináveis em 99 por cento das composições. Onde foram parar Caetano, Gil, Chico Buarque, Cazuza, Flávio José e tantos outros compositores que nos abriram as portas de sonhos possíveis e de utopías? Foram subjugados pelo afã capitalista das platéias cheias de mentes vazias? Ou, triste destino de todos nós, cansaram? Que me perdoem as queridíssimas leitoras e os não menos queridos leitores, mas o lamento tornou-se indispensável ao ouvir um desses pagodes baianos com suas frases repetidas e andamento percursivo que se sucede na mesma sincronia, tal qual Sísifo, condenado a passar a viver para todo o sempre a empurrar uma pedra até o cimo de uma montanha, rolando a pedra, invariavelmente, ladeira abaixo, dando reinício à interminável jornada. Assim soa a bacurinha, o tantan e os surdos insuportáveis.
Volto a pedir escusas ao inestimável leitor por meus arroubos de insatisfação. Dito isso, vamos, portanto, aos assuntos merecedores da nossa atenção: hoje amanheceu um dia lindíssimo na insuperável Mar Grande. Um sol de rachar os miolos dos carecas, mas acompanhado de uma brisa refrescante, numa mistura que nos empurra na direção da Cantina da Angélica. E lá fomos nós, numa marcha acelerada em busca de uma cervejinha estupidamente gelada. E tinha.
Depois da refrescante cerveja, voltava à minha casa para escrever a crônica encomendada pelo editor chefe deste portal, cujo nome (do editor) me recuso a escrever até que ele providencie o pagamento das crônicas anteriores.
- Fale do cotidiano - me pediu o chefe. Pediu não, ordenou, porque ele é quem me paga, ou pelo menos deveria pagar.
Como falei, depois da cervejinha estupidamente gelada, retornava para casa pensando no cotidiano. Relembrava das batalhas que vivíamos, eu e Vitória, nas camas do Melancia, antigo prostíbulo localizado na Ladeira da Praça, Salvador, Bahia. Ah, Vitória, menina-mulher de Capim-Grosso (BA), a mais carinhosa de todas as putas do mundo... ou poderia, também, escrever sobre a atual situação do Esporte Clube Bahia, perigosamente próximo da zona de rebaixamento da série A do Brasileirão... ou ainda divagar sobre o existir, que nas palavras de Caetano Veloso, "a que será que se destina? Mais eis que, de súbito, minhas divagações são interrompidas, aliás, atropeladas, pelo repique repetitivo de uma bacurinha coadjuvado pelas ondas sonoras irritantes de um tantan. Tudo isso somado a uma voz grutual que gritava: "Diana quer varrer", "Diana quer varrer" sucessivamente uma trezentas vezes.
Senhor editor, encarecidamente peço dispensa de ter que escrever crônica hoje. Minha mente não consegue concatenar palavras que não sejam "Diana quer varrer", "Diana quer varrer"... Como dizíamos na já longuínqua juventude: peço penico!