Neste sĂĄbado (2), é celebrado o Dia Nacional do Samba. A data surgiu por iniciativa de um vereador baiano, Luis Monteiro da Costa, para homenagear Ary Barroso. Ary jĂĄ tinha composto seu sucesso "Na Baixa do Sapateiro", mas nunca havia posto os pés na Bahia. Essa foi a data que ele visitou Salvador pela primeira vez.
"Porque o samba é a tristeza que balança
E a tristeza tem sempre uma esperança
A tristeza tem sempre uma esperança
De um dia não ser mais triste não"
História
Dos batuques africanos às rodas de samba como conhecemos hoje, muitos foram os elementos incorporados nessa trajetória, que tem como um dos marcos importantes a casa da famosa baiana Tia Ciata ou HilĂĄria Batista de Almeida. A yalorixĂĄ reunia de sambistas a políticos em seu quintal para fazer samba, sempre depois das festas para os orixĂĄs. Ali, no coração do território que ficaria conhecido como Pequena Ăfrica, na região central do Rio de Janeiro, nasceria o primeiro samba a ser gravado, Pelo Telefone, do compositor Donga.
Até então o samba tinha um ritmo mais próximo do maxixe e foi aí que, por volta dos anos 1920, uma turma do bairro do EstĂĄcio, de acordo com os historiadores, viu uma oportunidade de criar uma escola de samba. E foi assim que nasceu a Deixa Falar, uma escola que nunca desfilou.
Mas esse grupo, formado por figuras como Mano Elói, Ismael Silva e Bide, fez também sambas de sucesso, que atravessaram gerações e continuam sendo cantados até hoje nas rodas espalhadas pelo Brasil.
Nascido nos terreiros
Em tese de doutorado sobre a relação do samba, espiritualidade e mulheres de axé, a pesquisadora e jornalista Maíra de Deus Brito, ressalta que o samba nasceu dentro dos terreiros, ganhando outras nuances quando chegou ao Rio de Janeiro.
"Quando Tia Ciata, Tia Perciliana, entre outras, saem da Bahia, da região do Recôncavo Baiano, e vão para o Rio de Janeiro, ali, vai ser desenvolvido outro samba, que é um samba urbano, o samba carioca, com temĂĄticas não sagradas", disse em entrevista à apresentadora Ana Pimenta, no programa Mosaico, das rĂĄdios nacionais da Amazônia e do Alto Solimões.
Embora desde o início tenham sido protagonistas na história do samba – apontadas como responsĂĄveis pelos primeiros sambistas cariocas – as mulheres ainda buscam reconhecimento. Na luta por um espaço mais democrĂĄtico, em 2018, surgiu o primeiro Encontro Nacional de Mulheres na Roda de Samba. A cada evento, as sambistas começam a tocar simultaneamente em diversas partes do Brasil e do mundo.
Cada canto, um samba
A pesquisadora ressalta ainda que em cada região do país o samba é influenciado por outros ritmos e valores culturais locais. No Norte, por exemplo, aproxima-se da influĂȘncia caribenha.
Em 2007, o Instituto Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu trĂȘs gĂȘneros do samba carioca como patrimônio cultural: rodas que cantam partido-alto, samba de terreiro e samba enredo.
"O samba não morre, porque estĂĄ sempre se reinventando", destaca a pesquisadora.
Na capital fluminense, as segundas-feiras são marcadas pelo Samba do Trabalhador, comandado por Moacyr Luz, que lota o Clube Renascença, casa referĂȘncia da resistĂȘncia negra na cidade. Uma das rodas mais disputadas, recebe tanto turistas como frequentadores assíduos, que cantam o repertório de cor, independentemente se faz ou não sucesso no rĂĄdio.
Oswaldo Cruz é um reduto histórico de grandes sambistas, como Monarco, Manaceia e Seu Mijinha. O bairro, formado pela população negra expulsa do centro com as reformas urbanas, tem nele a Feira das YabĂĄs, que resgata a cultura do samba no quintal, típico dos subúrbios cariocas. O evento, que celebra a cultura afro-brasileira, une música e comidas típicas feitas por matriarcas do samba, como Tia Surica.
Samba da BĂȘnção
Vinicius de Moraes
É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração
Mas pra fazer um samba com beleza
É preciso um bocado de tristeza
É preciso um bocado de tristeza
Senão, não se faz um samba não
Senão é como amar uma mulher só linda
E daí? Uma mulher tem que ter
Qualquer coisa além de beleza
Qualquer coisa de triste
Qualquer coisa que chora
Qualquer coisa que sente saudade
Um molejo de amor machucado
Uma beleza que vem da tristeza
De se saber mulher
Feita apenas para amar
Para sofrer pelo seu amor
E pra ser só perdão
Fazer samba não é contar piada
E quem faz samba assim não é de nada
O bom samba é uma forma de oração
Porque o samba é a tristeza que balança
E a tristeza tem sempre uma esperança
A tristeza tem sempre uma esperança
De um dia não ser mais triste não
Feito essa gente que anda por aí
Brincando com a vida
Cuidado, companheiro!
A vida é pra valer
E não se engane não, tem uma só
Duas mesmo que é bom
Ninguém vai me dizer que tem
Sem provar muito bem provado
Com certidão passada em cartório do céu
E assinado embaixo: Deus
E com firma reconhecida!
A vida não é de brincadeira, amigo
A vida é arte do encontro
Embora haja tanto desencontro pela vida
HĂĄ sempre uma mulher à sua espera
Com os olhos cheios de carinho
E as mãos cheias de perdão
Ponha um pouco de amor na sua vida
Como no seu samba
Ponha um pouco de amor numa cadĂȘncia
E vai ver que ninguém no mundo vence
A beleza que tem um samba, não
Porque o samba nasceu lĂĄ na Bahia
E se hoje ele é branco na poesia
Se hoje ele é branco na poesia
Ele é negro demais no coração
Eu, por exemplo, o capitão do mato
Vinicius de Moraes
Poeta e diplomata
O branco mais preto do Brasil
Na linha direta de Xangô, saravĂĄ!
A bĂȘnção, Senhora
A maior ialorixĂĄ da Bahia
Terra de Caymmi e João Gilberto
A bĂȘnção, Pixinguinha
Tu que choraste na flauta
Todas as minhas mĂĄgoas de amor
A bĂȘnção, Sinhô, a benção, Cartola
A bĂȘnção, Ismael Silva
Sua bĂȘnção, Heitor dos Prazeres
A bĂȘnção, Nelson Cavaquinho
A bĂȘnção, Geraldo Pereira
A bĂȘnção, meu bom Cyro Monteiro
VocĂȘ, sobrinho de Nonô
A bĂȘnção, Noel, sua bĂȘnção, Ary
A bĂȘnção, todos os grandes
Sambistas do Brasil
Branco, preto, mulato
Lindo como a pele macia de Oxum
A bĂȘnção, maestro Antonio Carlos Jobim
Parceiro e amigo querido
Que jĂĄ viajaste tantas canções comigo
E ainda hĂĄ tantas por viajar
A bĂȘnção, Carlinhos Lyra
Parceiro cem por cento
VocĂȘ que une a ação ao sentimento
E ao pensamento
A bĂȘnção, a bĂȘnção, Baden Powell
Amigo novo, parceiro novo
Que fizeste este samba comigo
A bĂȘnção, amigo
A bĂȘnção, maestro Moacir Santos
Não és um só, és tantos como
O meu Brasil de todos os santos
Inclusive meu São Sebastião
SaravĂĄ! A bĂȘnção, que eu vou partir
Eu vou ter que dizer adeus
Ponha um pouco de amor numa cadĂȘncia
E vai ver que ninguém no mundo vence
A beleza que tem um samba, não
Porque o samba nasceu lĂĄ na Bahia
E se hoje ele é branco na poesia
Se hoje ele é branco na poesia
Ele é negro demais no coração
Redação, com AgĂȘncia Brasil