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Kant, Nietzsche, Arendt, Sartre e a mentira

João das Botas

Por Jorge Matos em 22/10/2024 às 11:01:16
Immanuel Kant. Imagem: Internet

Immanuel Kant. Imagem: Internet

Conforme prometido na crônica de ontem, onde fiz rasteira análise sociológica, faço, sem delongas, uma análise filosófica da mentira. A mentira é um conceito profundamente discutido por várias correntes e filósofos ao longo da história. A mentira coloca questões éticas, ontológicas e epistemológicas sobre a verdade, a moralidade e a natureza do discurso humano.

Para Kant, a mentira é sempre moralmente condenável. Em sua ética deontológica, a veracidade é uma obrigação moral absoluta. Para ele, mentir não é apenas errado porque engana outra pessoa, mas porque corrompe o próprio conceito de humanidade. Kant argumenta que, ao mentir, o mentiroso trata o outro como um meio para atingir seus próprios fins, em vez de respeitá-lo como um fim em si mesmo. Mesmo em situações extremas, como a famosa questão do "assassino na porta", Kant defende que mentir não é justificável.

Friedrich Nietzsche, considerado um doido de marca maior por muita gente (inclusive eu) em oposição ao rigor kantiano, vê a verdade e a mentira de forma mais relativa. Para ele, a verdade é uma "fábula móvel", uma construção criada por convenção social para servir a determinados propósitos. A mentira, portanto, pode ser vista como uma forma de desafiar a rigidez dessas convenções. Nietzsche propõe que as pessoas vivem por meio de "mentiras" aceitas culturalmente, e que o engano pode ser uma forma de autoafirmação ou de criação de novos valores.

Hannah Arendt explora a relação entre a mentira e a política, observando como a manipulação da verdade pode ter consequências devastadoras para a sociedade. Em "A Verdade e a Política", ela argumenta que a mentira pode ser usada para encobrir a realidade, mas que, ao fazer isso, destrói a capacidade de ação consciente. No espaço político, a verdade é necessária para que os cidadãos possam tomar decisões informadas, e a mentira sistemática cria um mundo de ilusões que impede a verdadeira liberdade.

Para Jean-Paul Sartre, a mentira também pode estar associada à má-fé (mau-caráter), que é uma forma de autoengano. Quando alguém mente, pode estar negando sua própria liberdade ou responsabilidade, se iludindo sobre quem realmente é. A mentira, assim, se torna um mecanismo para evitar o confronto com a própria autenticidade e com a realidade de nossas escolhas. Mentir para os outros ou para si mesmo seria, nessa visão existencialista, uma forma de fugir da angústia existencial.

Conexões entre a sociologia e a filosofia:

A mentira, em ambas as análises, é um fenômeno que revela tensões entre a necessidade de ordem e a busca pela verdade. Na sociologia, vemos como ela serve para manter ou abalar estruturas sociais e relações de poder. Na filosofia, a mentira é vista em termos de dilemas morais e a construção da verdade, refletindo sobre a própria condição humana. Em ambas as abordagens, a mentira não é apenas uma questão de desvio de uma norma, mas um espelho da complexidade das interações humanas e dos desafios éticos que enfrentamos ao navegar em uma sociedade interligada por comunicação e confiança.

Posto tudo isto que aqui vai, volto à minha fuga da angústia existencial valendo-me de duas latinhas de cerveja. Amstel, porque, sem desgostar das demais, gosto dela.

Volto amanhã!

Fonte: Redação

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