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ESPECIAL

Coletiva evidencia um Putin 'realista' e um Ocidente 'reativo', dizem especialistas

Putin afirmou que não virá ao Brasil para a Cúpula do G20


Foto: Sputnik / POOL / Acessar o banco de imagens

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, concedeu uma entrevista a jornalistas dos países-membros do BRICS em virtude da 16ª cúpula do grupo que acontece em Kazan entre os dias 22 e 24 de outubro. À Sputnik Brasil, especialistas descreveram as respostas de Putin como equilibradas e sensatas, o oposto do que costuma noticiar o Ocidente.

Durante a conferência, a Sputnik esteve representada por Dmitry Kiselev, diretor-geral do grupo midiático Rossiya Segodnya. O Brasil também esteve presente com Daniel Rittner, diretor editorial da CNN Brasil.

À Rittner Vladimir Putin afirmou que não virá ao Brasil para a Cúpula do G20, uma vez que mesmo que a Federação da Rússia não reconheça a jurisdição do Tribunal Penal Internacional (TPI) e, portanto, não se preocupe com o mandato emitido pela entidade, o líder russo não quer que sua presença roube o foco do evento.

"Nós entendemos o que está acontecendo em torno da Rússia. Eu também entendo. O presidente Lula e eu temos uma relação de amizade maravilhosa. Eu iria lá especificamente para atrapalhar o trabalho normal deste fórum?"

Além de Kiselev e Rittner, integraram a coletiva de imprensa Admasu Damtew Belete (Etiópia), diretor-geral da agência de notícias FANA; Salahaldin Maghauri (Egito), editor-chefe adjunto da Agência de Notícias do Oriente Médio (MENA); Nadeem Koteich (Emirados Árabes Unidos), diretor geral da Sky News Arabia; Faizal Abbas (Arábia Saudita), editor-chefe do jornal Arab News; Iqbal Surve (África do Sul) presidente executivo da Independent Media; Sudhakar Nair (Índia), editor executivo da agência de notícias PTI; Fan Yan (China), diretor e editor-chefe da rede de televisão CGTN e editor-chefe adjunto da China Media Corporation.

Aos jornalistas, Putin entrou em temas como a ascensão dos BRICS, o conflito na Ucrânia, e o uso de sanções para prejudicar a economia russa.

Paz na Ucrânia

Dentre a falas sobre o conflito na Ucrânia, nas quais sublinhou que Kiev é utilizada como ponta de lança pela OTAN em seu objetivo de derrotar a Rússia, Putin elogiou a formulação de paz sino-brasileira, destacando que não possuía conhecimento da iniciativa e foi pego de surpresa.

Para Vinicius Modolo Teixeira, professor de geopolítica da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) e especialista em organizações de tratados militares, o Brasil e a China acertaram ao não consultar Moscou quanto sua iniciativa. Dessa forma, diz, os atores que já são parceiro do BRICS, evitam acusações de parcialidade e constroem um plano propositivo e autêntico.

À reportagem o professor de história e pesquisador do Núcleo de Estudos das Américas (Nucleas) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) João Cláudio Pitillo explica que a chamada proposta sino-brasileira na verdade não é uma proposta de paz bem delineada, mas sim um "conjunto de teses que podem nortear esse processo de paz".

No entanto, em sua fala Putin criticou a postura ucraniana. "O lado ucraniano não considera possível realizar qualquer tipo de negociações. Ele apenas formula suas demandas e isso é tudo. Isso não é negociação", disse.

Segundo Pitillo, o líder russo tem motivos para estar cético com a diplomacia de Kiev. O regime de Zelensky não só cortou todas os canais diplomáticos e proibiu, através de um decreto, qualquer tipo de negociação com representantes russos, como abandonou a mesa de negociações de 2022 a mando dos líderes euroatlânticos.

"Na ausência do debate da diplomacia só sobrou o campo de batalha e a guerra. Ao romper esse acordo e encerrar os canais com Moscou, há dúvida se isso não era um desejo da OTAN e não um desejo de Kiev. Então o presidente Putin tem muita razão em estar desconfiado disso."

Mais do que suspeito da chancelaria ucraniana, as declarações de Putin são um reflexo da "realidade dos últimos meses do conflito", afirma Modolo, que sublinha o recente "Plano da Vitória" anunciado por Zelensky. "Isso coloca a Ucrânia em uma situação bastante complicada de não querer negociar", afirma.

Ascensão do BRICS

Outro ponto de destaque da coletiva de imprensa de Putin foram suas falas sobre a reorganização mundial, liderada pela ascensão do BRICS. Para o presidente da Federação da Rússia, a prosperidade do grupo de países ocorre de maneira natural.

À Sputnik Brasil, Késsio Lemos, doutor em relações internacionais e pesquisador do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE), sublinha que a qualificação de Putin ressoa "positivamente para muitos países do Sul Global, que já muito tempo buscam uma maior representação nas instituições internacionais e nas tomadas de decisão globais."

O líder russo destacou ainda uma fala do premiê indiano, Narendra Modi, de que os países do BRICS não compõe um grupo antiocidental, apenas são países não ocidentais.

A resposta de Putin também destaca um aspecto muito importante que não permite que o grupo seja qualificado como antiocidental. "O BRICS não se furta de ter uma comércio franco com países do capitalismo central", diz Pitillo. "O problema é que esses países constituíram uma ordem hegemônica que visa impedir os países do BRICS de se desenvolverem."

"Realmente", diz o professor da Unemat, "o BRICS simboliza em grande medida essa mudança da ordem mundial por conta da representatividade econômica", enquanto o Ocidente — descrito como o eixo euroatlântico —, "tem perdido a sua representatividade a nível mundial, mas ainda é muito poderoso".

Contudo, Modolo destaca que em vez pensar em uma nova estratégia de mediação de relações a nível mundial, as potências ocidentais têm sido "reativas tentando frear a ascensão desses polos de poder".

"A realidade que se impõe hoje no mundo não é mais a realidade que o Ocidente gostaria de ter no século XXI, de ver seu poder consolidado e não corroído."

Sanções à Rússia

Uma das formas que o Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, mina o desenvolvimento dos considerados inimigos é através das sanções. Esse método foi feito com Cuba, Iraque, Coreia do Norte, Irã e China.

Após o início da operação especial em 2022, a Rússia se tornou uma das maiores vítimas dessa política, sendo impedida de usar do dólar para transacionar. Só que, ao contrário do que esperavam as nações euroatlânticas, a economia russa não colapsou, mas conseguiu se reorganizar e apresenta um bom crescimento.

"Agora 95% de todo comércio exterior da Rússia é feito com nossos parceiros em moedas nacionais", destacou Putin, como o rublo e o yuan.

De fato, ressalta Lemos, "a capacidade da Rússia de redirecionar seu comércio para parceiros como a China e a Índia tem mitigado alguns dos impactos esperados".

Por outro lado, os países da Europa passam por uma grande crise econômica com a perda de acesso às importações russas, em especial o gás natural.

"O efeito bumerangue sobre as economias ocidentais também deve ser considerado, uma vez que trouxe consequências econômicas custosas para os países sancionadores."

De acordo com Getúlio Alves de Almeida Neto, doutorando do programa de pós-graduação em relações internacionais San Tiago Dantas e integrante do Centro de Investigação em Rússia, Eurásia e Espaço Pós-Soviético (Cire), a resiliência econômica russa, "estabelecida enquanto projeto político há mais de uma década [...] se tornou um exemplo de que o cenário mundial é composto pela emergência de novos mercados e mecanismos financeiros alternativos ao dólar."

Nesse sentido, Almeida Neto concorda com o presidente russo de que o uso do dólar como ferramenta de coerção política provocou uma diminuição da confiança em relação à moeda estadunidense.

Já Lemos afirma que o uso de moedas alternativas, estratégia encontrada para contornar os sistemas ocidentais, "indica uma tendência de desdolarização em certas esferas econômicas".

Entretanto, ambos os especialistas afirmam que o dólar norte-americano ainda segue como principal moeda do comércio internacional. Mas a curto prazo, destaca Pitillo.

"A médio e longo prazo, o dólar está fadado ao fracasso enquanto uma moeda que servia para sequestrar as economias dos países em desenvolvimento."



Agência Sputnik

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